A importância de políticas de diversidade, contratação e promoção de mulheres no contexto da Lei de Igualdade Salarial

Em julho de 2023, com a sanção da Lei 14.611/2023, o Brasil iniciou uma nova fase na busca pela equidade de oportunidades e salários entre os gêneros no mercado de trabalho.

Se a igualdade salarial entre homens e mulheres que exercem trabalho de igual valor já era um direito previsto na CLT – portanto vigente desde 1943 e confirmado pela Constituição Federal de 1988 – fato é que em 2023, segundo o IBGE¹, as mulheres receberam em média 78,9% dos salários recebidos por homens, sendo este percentual de 73,9% para cargos de diretoria e gestão, 74,3% para cargos técnicos e de nível médio, e 82,7% para cargos de apoio administrativo.

E para combater de forma efetiva estas desigualdades injustificadas, a estratégia adotada pela chamada Lei de Igualdade Salarial é a transparência!

A principal novidade trazida por esta Lei é que partir de março de 2024, as empresas com mais de 100 funcionários são obrigadas a publicar semestralmente um relatório detalhando a razão entre o salário médio pago para homens e mulheres que ocupam a mesma função nos últimos 12 meses, considerando os grandes grupos da Classificação Brasileira de Ocupações, a “CBO”.

O chamado “Relatório de Transparência e Igualdade salarial de Mulheres e Homens” também traz informações sobre proporção entre homens e mulheres no quadro de colaboradores – com a indicação da composição deste percentual por mulheres negras e não negras e por homens negros e não negros, demonstrando a preocupação interseccional da nova Lei – e das políticas e critérios de remuneração implementado pela empresa.

O objetivo deste relatório, elaborado pelo Ministério do Trabalho e Emprego (“MTE”) a partir da consolidação dos dados extraídos do eSocial e do questionário do Portal Emprega Brasil, é lançar luz sobre as disparidades salariais existentes e promover a responsabilização das empresas.

A ideia é que a divulgação dos relatórios, entre outras finalidades, permita a comparação entre empresas e setores da economia, incentivando de forma positiva a competitividade pela igualdade salarial.

Fato é que os primeiros relatórios de transparência salarial já foram publicados e a existência – ou não – de políticas de diversidade, contratação e promoção de mulheres para alcançar a verdadeira equidade nas organizações foi evidenciada.

No canto inferior direito o relatório traz as seguintes informações para aumentar a diversidade:

  • Ações de apoio a compartilhamento de obrigações familiares para ambos os sexos;
  • Políticas de contratação de mulheres (negras, com deficiência, em situação de violência, chefes de família, LGBTQIA+);
  • Políticas de promoção de mulheres para cargos de direção e gerência.

A existência destas políticas é fundamental para demonstrar o comprometimento de uma empresa em relação à equidade de oportunidades e salários entre os gêneros e raças e deve ser vista não apenas como uma recomendação do órgão fiscalizador, mas como um investimento estratégico para a sustentabilidade da empresa.

Muito se fala a respeito da importância da compreensão da diversidade e inclusão como parte da estratégia de negócios das empresas. O movimento em prol da “DE&I” – sigla para Diversidade, Equidade e Inclusão, que há décadas era visto como “a coisa certa a ser feita”, em razão da pressão social e da chamada responsabilidade social das empresas, passa a ser visto como parte da estratégia de inovação e de sucesso financeiro, sendo encarado agora como “a coisa mais inteligente a ser feita”.

De acordo com o estudo “Diversity Matters: America Latina” da McKinsey & Company publicado em 2020², empresas que adotam a diversidade são mais saudáveis, felizes e rentáveis.

O estudo mostra que empresas que adotam a estratégia da diversidade possuem uma saúde organizacional – definida como a capacidade de entregar performance superior no longo prazo – mais sólida, sendo que as empresas com pontuações mais altas no Índice de Saúde Organizacional³ têm probabilidade 59% maior de superar a performance financeira de seus pares.

Além disso, empresas que adotam a DE&I em sua estratégia têm probabilidade até uma vez e meia maior de ter funcionários mais felizes e propensos a inovar em todas as funções e níveis da organização, sendo a diversidade uma poderosa ferramenta de retenção de talentos e de melhoras nos resultados.

Ao destacar as “ações para aumentar a diversidade” como um dos quadrantes do relatório, é possível inferir que o legislador e MTE entendem que estas medidas são essenciais para eliminar as barreiras que impedem a equidade entre os gêneros, raças e demais grupos subrepresentados no ambiente organizacional.

Vale também a ponderação de que podem ser fundamentais para mitigar, ainda que em seara administrativa ou judicial, as eventuais consequências das disparidades entre os salários evidenciadas através do relatório.

Isto porque a existência destas políticas demonstra o reconhecimento de que medidas devem ser adotadas e abre espaço para a estruturação de um plano de ação em relação à DE&I na organização.

No entanto, já se sabe que a implementação deste plano de ação e a consequente diminuição da disparidade de salários não acontece da noite para o dia.

Um plano de ação em DE&I exige, dentre outras medidas, a realização de um diagnóstico para a identificar das barreiras à igualdade e os desafios específicos da empresa em relação ao tema, que fomente a definição dos objetivos concretos que a organização pretende alcançar com o programa – sempre alinhados com a estratégia da empresa – e das metas para a sua materialização, que devem ser específicas, mensuráveis, atingíveis, relevantes e temporizáveis (conhecidas como metas “SMART”).

O plano deve incluir ações que abordem diferentes aspectos da DE&I na organização, como recrutamento e seleção, desenvolvimento profissional, cultura e combate ao assédio, sendo que cada ação deve ter um responsável definido, um prazo para implementação e indicadores para acompanhamento dos resultados.

A implementação das medidas deve ser apoiada por iniciativas de capacitação e de fortalecimento da responsabilização de executivos e gerentes, que devem ser os responsáveis pelo cumprimento das metas de diversidade e do monitoramento ativo do progresso da empresa em relação ao tema. A ideia de que este é um assunto exclusivo da área de recursos humanos deve ser esquecida.

Em resumo, a implementação de medidas de DE&I é um processo que demanda estratégia e tempo. Por isso, é crucial que as empresas iniciem essa jornada o mais rápido possível. Os resultados dessas ações não serão imediatos, mas serão refletidos na evolução dos relatórios de transparência salarial publicados ao longo dos semestres. Assim, o comprometimento contínuo e a monitorização ativa são fundamentais para o cumprimento do dever de igualdade salarial e da promoção da  diversidade e equidade no ambiente de trabalho.

 


¹IBGE (2024). Estatísticas de gênero: indicadores sociais das mulheres no Brasil. 3ª Edição. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv102066_informativo.pdf

²Disponível em: https://www.mckinsey.com/br/our-insights/diversity-matters-america-latina

³De acordo com o estudo “Diversity Matters: America Latina” da McKinsey & Company publicado em 2020, o Índice de Saúde Organizacional (OHI, na sigla em inglês), é banco de dados de propriedade da McKinsey, baseado em pesquisas com cerca de 60.000 funcionários de 40 empresas na América Latina, bem como nosso conjunto de dados globais de 5 milhões de pesquisas em 100 países.

De acordo com o mesmo estudo: “os funcionários de empresas comprometidas com a diversidade desejam permanecer mais tempo e aspiram alcançar níveis mais altos na organização. Esses funcionários têm probabilidade 36% maior do que seus pares de outras empresas de relatarem que desejam permanecer três anos ou mais na mesma empresa. E eles são 15% mais propensos a expressar seu desejo de serem promovidos”.

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