A Comissão de Esporte do Senado realizou, no último dia 9 de abril, a primeira audiência pública que discutiu dois projetos de lei que pretendem restringir a publicidade das apostas esportivas (bets).
O PL 2.985/2023, de autoria do senador Styvenson Valentim, visa restringir a publicidade e patrocínios por loteria de apostas de quota fixa, as populares bets. Atualmente, a legislação permite essa publicidade desde que sejam observadas melhores práticas de responsabilidade social (art. 33, da Lei 13.756/2018).
Contudo, vale ressaltar que não há regulamento que especifique claramente o que seriam as referidas “melhores práticas de responsabilidade social”, o que gera insegurança jurídica, especialmente para o setor das bets, visto tratar-se de um termo subjetivo que pode ser interpretado de forma diversa conforme o entendimento da autoridade judicial
Já o PL 3.405/2023, proposto pelo senador Eduardo Girão, foca especificamente em atletas, ex-atletas, clubes esportivos, comentaristas, influenciadores e celebridades, proibindo que esses façam propaganda de plataformas de apostas esportivas. Além disso, prevê que influenciadores e dirigentes das empresas sejam pessoalmente responsabilizados pelas infrações à legislação, o que pode ensejar discussões sobre responsabilidade penal individual, especialmente em casos de publicidade enganosa, omissiva ou dirigida a públicos vulneráveis, como menores de idade.
Aqui, também vale abrir um parênteses sobre um ponto relevante do PL 3.405/2023, ao atribuir ao profissional contratado para a propaganda uma responsabilidade que se aproxima de um dever fiscalizatório sobre a regularidade da atividade da plataforma anunciada.
Trata-se de uma exigência que, na prática, revela-se excessiva e de difícil operacionalização, especialmente quando aplicada a indivíduos que não possuem qualquer vínculo societário, gerencial ou técnico com a empresa anunciante.
Esperar que um atleta, influenciador ou comentarista realize uma espécie de due diligence sobre aspectos legais e regulatórios de uma plataforma de apostas antes de promover o serviço extrapola os limites razoáveis do papel de um contratante de publicidade. Tal imputação pode não apenas violar princípios básicos de imputação subjetiva no campo penal, mas também abrir margem para uma insegurança jurídica desproporcional no mercado de marketing digital.
Ambas as propostas surgiram motivadas por preocupações ligadas à saúde pública, especialmente à prevenção da ludopatia (vício em jogos de azar). Os parlamentares destacam que a publicidade agressiva e direcionada ao público jovem estaria contribuindo para o aumento significativo do número de apostadores compulsivos. Outro fator é o receio sobre a possível manipulação de resultados esportivos em razão das relações financeiras entre casas de apostas, equipes e atletas. Todos esses fatores podem também refletir em uma tendência de maior criminalização de condutas associadas à exploração indevida da vulnerabilidade de consumidores, abrindo espaço para possíveis imputações penais por induzimento ao erro ou lesão à saúde.
Durante a audiência, foram apresentados diferentes pontos de vista: especialistas da área da saúde e representantes do esporte alertaram sobre os danos causados pelo jogo compulsivo e possíveis riscos para a integridade esportiva. Por outro lado, representantes do mercado defenderam a liberdade econômica e a necessidade de regulamentação mais equilibrada, argumentando que a autorregulação e campanhas educativas seriam mais eficazes do que proibições totais.
Os projetos apresentam pontos sensíveis caso sejam aprovados integralmente. Os patrocínios das casas de apostas representam valores milionários para clubes esportivos brasileiros, significando que uma proibição abrupta traria desafios financeiros imediatos para o setor esportivo. Além disso, existe o risco de migração das apostas para plataformas internacionais não reguladas, comprometendo a eficácia da fiscalização e controle.
Diante desse cenário, é importante que empresas avaliem não apenas o impacto contratual e econômico das restrições em discussão, mas também os potenciais reflexos penais, inclusive para executivos e representantes legais envolvidos em campanhas publicitárias, negociações com plataformas ou administração de clubes patrocinados.
Aliás, empresas e empresários envolvidos direta ou indiretamente com o mercado esportivo devem acompanhar atentamente a tramitação destes Projetos de Leis, já que as decisões podem impactar significativamente os contratos em vigor e estratégias comerciais futuras.