O risco jurídico das falhas logísticas na Black Friday

A Black Friday consolidou-se como uma das datas mais importantes do comércio brasileiro, impulsionando fortemente o volume de vendas e o faturamento.

Entretanto, o aumento das vendas durante esse período também tende a elevar o número de reclamações e demandas judiciais, especialmente quando não são observadas as normas de proteção ao consumidor, como o cumprimento dos prazos de entrega, a garantia de troca de produtos, o respeito ao direito de cancelamento ou estorno e a adequada prestação de informações.

Com o crescimento das operações digitais e a alta concentração de vendas em poucos dias, falhas logísticas, indisponibilidade de canais de atendimento e atrasos na devolução de valores tornam-se mais frequentes. Esses fatores, além de comprometerem a experiência do consumidor, podem resultar no ajuizamento de ações judiciais e em prejuízos relevantes à imagem e à credibilidade da marca.

Diante desse cenário de intensificação das vendas e do maior volume de transações online, observa-se uma atenção redobrada dos órgãos de defesa do consumidor e do próprio Poder Judiciário quanto ao cumprimento das normas do CDC. Essa postura tem se refletido nas decisões do Tribunal de Justiça de São Paulo, que vem consolidando entendimentos rigorosos quanto à responsabilidade das empresas que atuam no comércio eletrônico.

Em casos de atraso na entrega de mercadorias, por exemplo, quando o consumidor não recebe suporte efetivo para solucionar o problema, o Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) tem reconhecido indenizações por danos morais, sem prejuízo de demais condenações, com valores que oscilam entre R$ 2.000,00 e R$ 5.000,00, a depender da gravidade e da conduta adotada.

Ao julgar um caso em que o consumidor adquiriu um produto que não lhe foi entregue[1], o TJSP entendeu pela obrigação de todos os integrantes da cadeia de fornecimento, incluindo a revendedora da plataforma de comércio digital, de reembolsar a totalidade do valor do produto, além de condená-los à indenização por danos morais, sob o argumento de que a não entrega do produto, sem atendimento, retorno ou solução ao consumidor, beira o descaso.

Em outro julgamento, também envolvendo a compra de mercadoria em site, em que houve atraso na entrega, além de o produto ter sido entregue com defeito, o TJSP entendeu pela condenação da empresa de e-commerce pelos danos morais suportados, diante da demora na resolução do problema.

Vale lembrar que, segundo a norma consumerista, a responsabilidade do fornecedor é objetiva, ou seja, basta a demonstração do dano e do nexo de causalidade com a falha na prestação do serviço para que surja o dever de indenizar, independentemente de culpa. Isso significa que falhas operacionais ou omissões no atendimento podem gerar condenações, ainda que a empresa não tenha agido de forma intencional.

Tais questões demonstram, portanto, que a atenção preventiva é fundamental, sobretudo em épocas de alta demanda como a Black Friday e o fim de ano. O volume elevado de pedidos, somado à pressão operacional, não reduz a responsabilidade das empresas; ao contrário, exige planejamento, monitoramento e atuação integrada entre as áreas de atendimento, logística e jurídico.

Para as empresas de e-commerce, isso reforça a importância de uma gestão preventiva de risco, pautada em políticas claras de entrega, comunicação transparente com o consumidor, canais de atendimento acessíveis e respostas rápidas às reclamações. Além disso, a atuação estratégica do jurídico, acompanhando de perto as práticas comerciais e os precedentes judiciais, é essencial para mitigar riscos, reduzir litígios e preservar a confiança da marca.

[1] (TJSP; Apelação Cível 1082713-40.2022.8.26.0100; Relator(a): José Augusto Genofre Martins; Órgão Julgador: 29ª Câmara de Direito Privado; Data da Decisão: 18/02/2025; Data de Publicação: 18/02/2025)

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