O mês de maio nos convida à reflexão sobre o papel transformador da maternidade — não apenas no seio da família, mas também no ambiente de trabalho. Falar de mães é, inevitavelmente, falar de força, de resiliência e, sobretudo, de resistência.
No Brasil, a legislação trabalhista caminhou, ao longo das últimas décadas, no sentido de reconhecer, proteger e promover os direitos das mulheres que enfrentam o duplo — e muitas vezes triplo — desafio de ser mãe, profissional e cidadã.
Mais do que um conjunto de normas, os direitos trabalhistas das mães representam o esforço da sociedade brasileira em conciliar a proteção à maternidade com a permanência da mulher no mercado de trabalho em condições de igualdade e dignidade.
Embora esse papel duplo ou triplo seja desempenhado pelas mulheres mães desde sempre, apenas com a promulgação da CLT, em 1943, é que se reconheceu a necessidade de garantir um período de afastamento remunerado às gestantes, além de proteção contra atividades que colocassem em risco a saúde da mulher e do nascituro.
A questão ganhou contornos ainda mais sólidos com a Constituição Federal de 1988, que conferiu à proteção à maternidade o seu caráter de direito fundamental. Ao assegurar a licença-maternidade de 120 dias e vedar a dispensa arbitrária da gestante, a Carta Magna fortaleceu juridicamente o princípio da dignidade da pessoa humana e da valorização do trabalho da mulher.
A presença feminina — e materna — no mercado de trabalho brasileiro é uma realidade incontestável. Mães atuam em todos os setores da economia, das fábricas às salas de aula, dos escritórios aos hospitais. E, frequentemente, o fazem sob condições que exigem delas um esforço redobrado para conciliar demandas profissionais com a criação dos filhos.
Nesse contexto, os direitos trabalhistas não devem ser vistos apenas como garantias legais, mas como instrumentos de justiça social e de combate à desigualdade estrutural de gênero. Garantir estabilidade no emprego, acesso à licença-maternidade adequada e condições de trabalho respeitosas não é apenas cumprir a lei — é afirmar o valor da maternidade na construção de um país mais equânime.
A maternidade, embora muitas vezes invisibilizada nas estruturas do mercado, é força ativa na economia. Mães compõem significativa parte da força de trabalho nacional e, em muitos lares, são o único ou principal arrimo de família. Ainda assim, sofrem os impactos da desigualdade de gênero, da informalidade e da ausência de políticas corporativas efetivas de apoio à parentalidade.
Valorizar a mãe trabalhadora é compreender que a proteção legal não é um privilégio — mas sim uma condição essencial para equilibrar as exigências do mercado com a realidade concreta da vida familiar.
Assim, ao longo dos anos, o ordenamento jurídico brasileiro foi enriquecido por normas e decisões judiciais que consolidaram a proteção à maternidade como eixo fundamental do direito do trabalho.
Entre essas conquistas, destaca-se, em primeiro lugar, a estabilidade provisória no emprego da gestante. Prevista no artigo 10, inciso II, alínea “b”, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, a estabilidade se estende desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto e não depende do tipo de contrato firmado com a empregadora.
De modo reiterado, o Tribunal Superior do Trabalho já reconheceu que esse direito subsiste mesmo nos contratos por prazo determinado ou de experiência, entendimento reforçado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do Tema 497, cuja repercussão geral consolidou a tese da estabilidade objetiva e indisponível, inclusive quando a gestante ou a empresa desconhecem a gravidez à época da dispensa.
Outro marco importante foi a licença-maternidade de 120 dias, assegurada pela Constituição Federal e regulamentada pela Lei nº 8.213/1991, com possibilidade de prorrogação por mais 60 dias para empresas que aderirem ao Programa Empresa Cidadã (Lei nº 11.770/2008).
Durante esse período, a trabalhadora tem seu contrato de trabalho suspenso, mas continua recebendo sua remuneração por meio do salário-maternidade, pago pelo INSS.
Além disso, a legislação prevê direitos específicos durante a gestação, como o comparecimento a consultas e exames médicos sem prejuízo da remuneração e a possibilidade de alteração temporária das funções ou do local de trabalho para garantir a saúde da gestante, conforme disposto no artigo 394-A da CLT.
Com a reforma trabalhista, houve tentativa de flexibilização do trabalho em ambientes insalubres, mas o Supremo Tribunal Federal, ao julgar a ADI 5938, reafirmou a inconstitucionalidade do trabalho da gestante em atividades insalubres de qualquer grau, resguardando o direito ao afastamento sem prejuízo da remuneração.
Após o parto, até que o bebê complete seis meses de idade, a mãe trabalhadora tem direito a dois intervalos diários de trinta minutos para amamentação, conforme previsto no artigo 396 da CLT.
Trata-se de uma pausa remunerada que deve ser respeitada, sendo vedado o seu desconto ou supressão, salvo por liberalidade da empregada e mediante previsão em norma coletiva. A jurisprudência tem sido firme em considerar nula qualquer cláusula contratual que limite esse direito de forma lesiva à lactante.
Cabe ainda destacar os avanços no reconhecimento da licença-maternidade por adoção e multiparentalidade. O artigo 392-A da CLT equiparou os direitos das mães adotantes aos das biológicas, garantindo-lhes o mesmo período de licença e estabilidade no emprego.
De maneira complementar, decisões do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça têm assegurado o direito à licença-maternidade para mães não gestantes em uniões homoafetivas, reconhecendo a importância da função materna no cuidado e no desenvolvimento da criança, independentemente do vínculo biológico.
Muitas das alterações foram obtidas com o Marco Legal da Primeira Infância (Lei nº 13.257/2016), que refletem um compromisso normativo com a proteção à maternidade não apenas como evento biológico, mas como responsabilidade social compartilhada entre Estado, empresas e sociedade.
Embora a respectiva lei tenha vindo com a intenção de proteção infantil, ela vai muito além disso, já que fortalece o papel da mãe como figura central no desenvolvimento da criança e reconhece sua condição como trabalhadora, cuidadora e cidadã.
Apesar do arcabouço normativo sólido, a realidade de muitas mães trabalhadoras ainda é marcada por obstáculos: discriminação em processos seletivos, demissões disfarçadas, ausência de estrutura para amamentação e sobrecarga de jornada.
O mercado de trabalho, em grande parte, ainda funciona sob uma lógica que desconsidera a maternidade como elemento central da vida profissional das mulheres.
Essa desconexão entre a norma e a prática reforça a urgência de se promover uma cultura organizacional verdadeiramente inclusiva, com políticas internas de apoio à parentalidade e ações afirmativas que valorizem o papel da mãe não como obstáculo à produtividade, mas como símbolo de competência, gestão do tempo, empatia e liderança.
O resultado do compromisso com a equidade de gênero passa leva ao reconhecimento de que a maternidade não deve ser penalizada, mas acolhida pelo mundo do trabalho. A valorização das mães profissionais — com seus direitos respeitados e sua presença estimulada — é uma condição indispensável para a construção de um mercado mais justo, sustentável e humano.
Neste Mês das Mães, celebramos não apenas os direitos conquistados, mas também a luta cotidiana de tantas mulheres que, mesmo diante das adversidades, seguem contribuindo com talento, dedicação e sensibilidade para o desenvolvimento das empresas e da sociedade.
O reconhecimento da mãe trabalhadora não se resume à proteção legal, mas à valorização integral de sua presença, potência e protagonismo.