ESG. PESSOAS COM DEFICIÊNCIA: QUE TAL DIVERSIFICAR A DIVERSIDADE?

As propostas trazidas pela agenda ESG já não são uma novidade no ambiente corporativo.

Há um ano e meio sendo divulgada, discutida e entendida, a ideia de que uma empresa deve fazer mais do que suas obrigações formais sobre os prismas Ambiental, Social e de Governança, e de que deve atender não apenas aos anseios de seus acionistas, mas também dos demais stakeholders[1] envolvidos, tem se tornado parte de um novo cenário do mercado.

E, dentre as providências que uma empresa pode adotar para se propor a seguir alinhada com essa agenda, algumas ações têm ganhado mais destaque do que outras, como, por exemplo, compromissos pela redução de emissão de gases poluentes, o mercado de carbono, a representatividade de negros e mulheres em cargos de liderança, a emissão de títulos verdes como forma de financiamento, diversidade em função de raça e orientação sexual, bonificação de executivos atrelada a metas ESG entre outros.

Por outro lado, há também a sensação de que pautas tão importantes quanto às mencionadas, e não menos urgentes, estão sendo negligenciadas, ou melhor, não têm sido devidamente lembradas. Exemplo: pessoas com deficiência.

O viés do Social (S), ou da responsabilidade social, traz clara a necessidade de se incluir no ambiente corporativo de uma empresa grupos com baixa representatividade. A inclusão favorece a diversidade, e já é sabido que a diversidade potencializa sobremaneira a capacidade de uma empresa de fazer melhor, fazer mais, fazer diferente.

Todavia, as providências atreladas à inclusão por vezes não diversificam seu público alvo tanto quanto poderiam. Aspectos relacionados à orientação sexual, raça e origem social costumam ser mais comuns.

À margem dessa realidade, porém, existe todo um mundo de pessoas que também necessitam de apoio para serem incluídas no ambiente corporativo e, com isso, contribuírem socialmente e se desenvolverem pessoalmente, quais sejam, as pessoas com deficiência[2].

Não obstante haver uma norma legal (Lei n.8.213/91[3]) estabelecendo vagas destinadas a pessoas com deficiência, é comum se ouvirem queixas de empresas sobre a dificuldade de se preencherem essas cotas, via de regra sob o argumento de que é difícil localizar e contratar pessoas com esse perfil. Ora, se a dificuldade existe, talvez seja o caso de se redobrarem os esforços. Por certo existem consultorias especializadas que podem lhe auxiliar nessa jornada.

De acordo com o site do IBGE[4], a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) de 2019 identificou 17,3 milhões de pessoas com dois anos ou mais de idade (8,4% dessa população) com alguma das deficiências investigadas no levantamento, e cerca de 8,5 milhões (24,8%) de idosos estavam nessa condição.

Na população com 2 anos ou mais de idade, 3,4% (ou 6,978 milhões) tinham deficiência visual; 1,1% (ou 2,3 milhões) tinham deficiência auditiva e 1,2% (ou 2,5 milhões) tinham deficiência mental. Entre as pessoas de 5 a 40 anos de idade que tinham deficiência auditiva, 22,4% conheciam a Língua Brasileira de Sinais (Libras).

Cerca de 3,8% (7,8 milhões) das pessoas de 2 anos ou mais tinham deficiência física nos membros inferiores e 2,7% (5,5 milhões), nos membros superiores.

Importante destacar, todavia: apenas 28,3% das pessoas com deficiência em idade de trabalhar (14 anos ou mais de idade) estavam na força de trabalho, ante 66,3% daquelas sem deficiência. E cerca de 67,6% da população com deficiência não tinham instrução ou tinham o ensino fundamental incompleto, percentual que era de 30,9% para as pessoas sem nenhuma das deficiências investigadas.

São milhões de pessoas que sequer têm a chance de ingressar no mercado de trabalho.

Certo de que toda diversidade tem sua relevância e deve ser estimulada e incluída no ambiente corporativo, fazer além e a mais do que o convencional é um viés importante na agenda ESG.

Que tal colocar a inclusão de pessoas com deficiência, para além das cotas legais, no radar da sua empresa? Que tal diversificar a diversidade?

De todo modo, um ponto de atenção: a decisão por viabilizar o acesso de pessoas com deficiência em um ambiente corporativo deve ser precedida de treinamentos, entendimentos e, sobretudo, atenção e respeito. Fazer por fazer, ou fazer mal feito, não é uma opção[5].

Importante incorporar a inclusão verdadeira no ambiente da empresa, trazendo ou amplificando esse elemento em sua cultura organizacional, adequando espaços, dedicando tempo, recursos financeiros, pessoas e muito carinho para uma parcela significativa da população que anseia por oportunidades.

Essa é a real proposta da agenda ESG. Fazer mais, fazer além.

 

 

 

 

MARCO AURELIO BAGNARA OROSZ

marco.orosz@fius.com.br

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[1] Klaus Schwab, engenheiro e economista alemão, a mente por detrás do conceito capitalismo de stakeholders, conceitua essa expressão como “uma forma de capitalismo em que as empresas não apenas otimizam os lucros de curto prazo para os acionistas, mas buscam a criação de valor de longo prazo, levando em consideração as necessidades de todos os seus stakeholders e da sociedade em geral.”

[2] Aqui vale uma nota: a expressão ‘pessoas portadoras de deficiência’ não é mais utilizada; a pessoa tem uma deficiência, via de regra permanente, e não porta uma deficiência, como portaria uma bolsa ou uma carteira.

[3] A lei de cotas para PCDs, oficialmente chamada de Lei de Cotas (art. 93 da Lei nº 8.213/91), estabelece que empresas com cem ou mais empregados devem preencher uma parte dos seus cargos com pessoas com deficiência. A reserva de vagas – que é essa parcela de cargos reservados a pessoas com deficiência – depende do número total de empregados que a empresa tem. Por exemplo, empresas que tenham entre 100 e 200 empregados, devem reservar 2% das vagas a PCDs. Já empresas que tenham mais de 1000 empregados, precisam fazer uma reserva de 5% dos cargos, e assim por diante.

[4] https://censos.ibge.gov.br/2013-agencia-de-noticias/releases/31445-pns-2019-pais-tem-17-3-milhoes-de-pessoas-com-algum-tipo-de-deficiencia.html#:~:text=Estat%C3%ADsticas%20Sociais-,PNS%202019%3A%20pa%C3%ADs%20tem%2017%2C3%20milh%C3%B5es%20de%20pessoas,com%20algum%20tipo%20de%20defici%C3%AAncia&text=Em%202019%2C%20segundo%20a%20Pesquisa,de%20idosos%20estavam%20nessa%20condi%C3%A7%C3%A3o.

[5] O capacitismo é uma forma de preconceito contra pessoas com deficiência, que envolve uma preconcepção sobre as capacidades que uma pessoa tem ou não devido a uma deficiência, e geralmente reduz uma pessoa a essa deficiência. O capacitismo pode se manifestar em atitudes discriminatórias e preconceituosas contra pessoas com deficiência.

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