A unificação de informações públicas ainda não é uma realidade no Brasil. A propriedade imobiliária não foge à regra: sempre se conviveu com múltiplos cadastros e registros, cada qual com finalidade própria e mantido por órgãos diversos que pouco dialogavam entre si. O cidadão, por sua vez, ficava à mercê de consultas fragmentadas para reunir “pedaços” de dados e, só então, alcançar uma conclusão segura sobre informações de um determinado imóvel.
Com essa dificuldade em mente, foi instituído o Cadastro Imobiliário Brasileiro (CIB) pela Lei Complementar nº 214, de 16/01/2025, no âmbito das mudanças trazidas pela Reforma Tributária. Apoiado pelo SINTER — a plataforma federal de integração de informações territoriais — o CIB tem por objetivo criar um cadastro nacional com identificador único (código CIB), válido em todo o território, para cada unidade imobiliária georreferenciada (área e posição geográfica definidas em mapa).
Popularmente apelidado de “CPF dos imóveis”, a proposta é unificar e padronizar as informações imobiliárias sob um único repositório. A medida, porém, vai além da padronização: impacta a regularização imobiliária, a confiabilidade documental e a segurança das transações. O cadastro reunirá dados de imóveis rurais e urbanos, públicos e privados, a partir dos respectivos cadastros de origem, como o Cadastro Nacional de Imóveis Rurais (CNIR), do Incra, e os cadastros municipais de imóveis urbanos e rurais.
Imóveis com dados divergentes, matrículas irregulares, falta de inscrição municipal ou inconsistências em cadastros rurais e ambientais precisarão ser ajustados para que possam receber o novo código. Uma vez adotado como base central e confiável, o CIB poderá ser base confiável de informações para operações imobiliárias. Sem essa conformidade, negócios de compra e venda, locação ou financiamento poderão enfrentar entraves.
O Decreto nº 11.208/2022, ao instituir o SINTER – Sistema Nacional de Gestão de Informações Territoriais, já havia preparado o terreno para essa integração. Agora, com o CIB, cartórios e serviços de registro ficam obrigados a compartilhar dados em tempo real, alimentando uma base única. O resultado esperado é a redução de fraudes, a eliminação de sobreposição de cadastros e a criação de um valor de referência atualizado, mais próximo ao praticado no mercado. Esse valor poderá influenciar avaliações, perícias e até ações revisionais de aluguel.
Sobre o ponto do valor de referência, inclusive, o Governo Federal tem buscado enfatizar que o CIB não acarretará aumento de carga tributária, assegurando que o sistema não passa de um inventário dos imóveis, alimentado com dados dos municípios e cartórios, entre outros, e tem como finalidade dotar o Brasil de um cadastro imobiliário único.
Inserido no bojo da Reforma Tributária, naturalmente o CIB terá reflexos fiscais a serem observados. Contudo, primeiramente, seu efeito é a modernização documental, que reforça a função social da propriedade e amplia a segurança das operações. Posteriormente, com a introdução do IBS e da CBS no modelo de IVA dual, amplia-se o campo de incidência do tributo sobre o consumo; operações antes não alcançadas, como o aluguel de imóveis em determinadas situações, podem passar a integrar sua base de cálculo.
Outro ponto relevante é o impacto sobre o IPTU, calculado com base no valor venal do imóvel, estimado pelo Poder Público a partir do preço de mercado. Hoje, muitos municípios utilizam dados desatualizados ou incompletos, gerando distorções: alguns pagam menos do que deveriam; outros, mais.
A integração proporcionada pelo CIB tende a conferir maior precisão às informações de cada imóvel, o que pode exigir a revisão e atualização do valor venal, a base de cálculo do IPTU. Com dados integrados de cartórios, Receita Federal e demais órgãos, as prefeituras municipais poderão rever os valores venais dos imóveis, considerando informações não antes disponibilizadas, como área construída, benfeitorias, localização e destinação. Isso pode elevar o IPTU de imóveis subavaliados, assim como reduzir a carga em casos de superavaliação.
Esse movimento deve ser mais perceptível em cidades menores, com menor estrutura técnica, onde a tendência é adotar o CIB como referência de arrecadação, já que não existe uma estrutura robusta para aferição.
Em conclusão, o CIB representa um avanço institucional ao centralizar e unificar informações, elevando a transparência e a segurança das operações; contudo, é legítimo o receio de impactos econômicos (como revisões de valor venal e eventuais reflexos tributários), motivo pelo qual o tema pede estudo técnico, calma e verificação caso a caso.