O projeto, atualmente em análise na Câmara dos Deputados e ainda sujeito a alterações, propõe a revogação da Lei nº 7.290/1984, que regula a atividade do transportador rodoviário autônomo de bens. O objetivo central da proposta é modernizar e aperfeiçoar a definição jurídica do transportador autônomo de cargas, promovendo uma distinção mais clara entre esse profissional, as empresas transportadoras e as cooperativas de transporte.
De autoria do deputado Toninho Wandscheer, a proposição fundamenta-se na constatação de que a Lei nº 11.442/2007 já estabeleceu um novo marco legal para o transporte rodoviário de cargas. Embora essa norma tenha avançado em relação à legislação anterior, detalhando aspectos relevantes da atividade, ela não revogou expressamente a Lei nº 7.290/1984, o que, segundo Toninho, pode gerar insegurança jurídica nas relações entre transportadores, empresas de transporte e embarcadores.
Como exemplo de uma das discrepâncias que podem gerar conflitos interpretativos e aumentar a judicialização dos contratos de transporte, a Lei nº 7.290/1984 define o Transportador Rodoviário Autônomo de Bens (TAC) como a pessoa física proprietária ou coproprietária de um único veículo. Já a Lei nº 11.442/2007 caracteriza o Transportador Autônomo de Cargas (TAC) como pessoa física proprietária, coproprietária ou arrendatária de pelo menos um veículo, ampliando significativamente o escopo da atividade.
Nesse sentido, a proposta insere uma nova redação para o art. 2º, inciso II, definindo o TAC como “a pessoa física que, com até dois veículos automotores de sua propriedade registrados em seu nome, realiza transporte rodoviário de cargas por conta de terceiros, mediante remuneração, de forma habitual, sem relação de subordinação jurídica com o contratante”.
Sob o aspecto contratual, a eventual aprovação do projeto pode gerar reflexos imediatos nos contratos de transporte celebrados com TACs, especialmente em três frentes:
A exigência de que o TAC possua no máximo dois veículos e os tenha registrados em seu nome impõe um novo critério objetivo. Isso poderá exigir ajustes contratuais quanto à qualificação da parte contratada, evitando a inclusão de motoristas que não se enquadrem no novo conceito legal e protegendo a empresa contratante contra riscos de autuação ou questionamentos jurídicos.
Além disso, a definição de transportador autônomo de cargas importa também para a regularidade na contratação dos seguros obrigatórios definidos pela Lei nº 11.442/2007, considerando que há uma grande diferença com relação às exigências atribuídas às Empresas de Transporte Rodoviário de Cargas (ETC).
Isso porque, após as alterações trazidas pela Lei nº 14.599/2023 à Lei nº 11.442/2007, as ETCs passam a ser obrigadas a contratar os seguros de Responsabilidade Civil do Transportador Rodoviário de Carga (RCTR-C), de Responsabilidade Civil por Desaparecimento de Carga (RC-DC) e de Responsabilidade Civil de Veículo (RC-V), enquanto que, com relação aos TACs, os dois primeiros seguros deverão ser contratados pelo contratante do serviço emissor do conhecimento de transporte e do manifesto de transporte, sendo o TAC considerado preposto do tomador de serviços, não cabendo sub-rogação por parte da seguradora contra ele, e o RC-V, de igual modo, deverá ser firmado pelo contratante do serviço, por viagem, em nome do TAC.
Assim, a definição uníssona da legislação quanto ao termo é importante também para que as disposições contratuais acordadas entre as partes com relação ao seguro reflitam a legislação e a apólice adquirida junto à seguradora.
Com a nova definição trazida pelo PL 3308/2024, vislumbra-se a possibilidade de um ambiente de maior segurança jurídica para a alocação de riscos, especialmente no tocante às obrigações fiscais, previdenciárias e operacionais. Contratos que hoje seguem um modelo padronizado para transportadoras e/ou embarcadoras poderão, caso o texto proposto seja aprovado, demandar versões distintas, adaptadas à natureza jurídica dos contratados — sejam transportadores autônomos de carga (TACs), cooperativas ou empresas —, a fim de refletir com precisão os direitos e deveres de cada parte.
Além disso, o PL pode influenciar práticas de subcontratação e a relação com cooperativas de transporte, que por vezes intermedeiam serviços com TACs de forma pouco clara sob o aspecto contratual.
A proposta do PL 3308/24 surge como uma tentativa de equilibrar os interesses do setor de transporte e merece acompanhamento próximo, conferindo maior clareza à atuação dos transportadores autônomos sem comprometer sua autonomia e natureza empresarial. Para as empresas contratantes, o momento é oportuno para acompanhar o progresso do PL e se preparar para revisar contratos padrão em caso de aprovação, com a atualização das cláusulas de qualificação, seguros, responsabilidade e autonomia, reforçando o compliance contratual frente às alterações normativas em curso.
O projeto tramita em caráter conclusivo e não há previsão de data para sua aprovação, visto que deverá ser aprovado pelas comissões de Viação e Transportes, de Trabalho e de Constituição e Justiça e de Cidadania, após análise. O avanço da proposta poderá representar mudanças na regulação do transporte rodoviário de cargas, exigindo adaptação ágil e estratégica por parte de quem celebra e gerencia contratos logísticos. O jurídico consultivo ganha protagonismo nesse cenário, assegurando que as novas regras se traduzam em práticas contratuais coerentes e seguras.
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Fontes:
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao
https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra?