A recente crise envolvendo a falsificação de bebidas alcoólicas com metanol, substância altamente tóxica e proibida para consumo humano, revelou uma ameaça que ultrapassa o campo criminal e coloca em risco a reputação das marcas envolvidas. A crise também expôs diversas vulnerabilidades estruturais na cadeia produtiva e de distribuição de bebidas, inclusive na logística reversa das garrafas, afetando a saúde pública e abalando a confiança em marcas de reputação consolidada. Mais do que um caso isolado de fraude, o episódio evidencia o desafio de garantir a autenticidade e a proteção dos ativos intangíveis — especialmente das marcas — diante de um mercado paralelo cada vez mais sofisticado.
O episódio reforça a importância de as empresas incorporarem, à gestão da propriedade intelectual e da reputação da marca, práticas de combate à pirataria que vão desde a contratação de fornecedores até a gestão das embalagens — pontos que devem integrar as políticas de compliance e controle de cadeia. A proteção marcária não deve se limitar ao registro formal, mas envolver ações como estudo de mercado, mapeamento de riscos do setor, inclusive de atividades criminosas, mecanismos de verificação de autenticidade acessíveis ao consumidor, contratos de fornecimento e distribuição com cláusulas de rastreabilidade, além de políticas de descarte e programas internos de integridade aplicáveis a parceiros comerciais e industriais.
A oferta de produtos falsificados ao consumidor final gera prejuízos em duas frentes: coloca vidas em risco imediato e compromete a perenidade dos negócios, afetando vendas, valor de marca, processos industriais protegidos e a reputação construída ao longo do tempo.
A falsificação pode envolver violações a diversas formas de proteção da propriedade intelectual, como o uso indevido de marcas e a imitação de rótulos e embalagens, que fere o trade dress, além da possível violação de segredos industriais e da prática de concorrência desleal.
Tais práticas desvalorizam ativos intangíveis e colocam em xeque a solidez de empresas que seguem rigorosamente padrões técnicos e regulatórios, impactando todo o setor.
O impacto desses atos ilícitos pode ser devastador: a empresa que tem seu produto falsificado enfrenta uma ameaça direta à sua identidade comercial e à confiança de seus consumidores. Por isso, o enfrentamento da falsificação exige mais do que respostas penais: requer ação estratégica, inteligência de mercado e proteção jurídica efetiva, com contratos robustos que abranjam criação de rótulos, envasamento e distribuição, além de monitoramento constante para coibir o uso indevido das marcas.
Sob a ótica da propriedade intelectual, o enfrentamento da falsificação requer atuação integrada entre as áreas jurídica, de marketing e de compliance. Nos casos que afetam diretamente a saúde pública, é essencial a cooperação com autoridades policiais e governamentais, por meio do Conselho Nacional de Combate à Pirataria (CNCP).
É recomendável que as empresas mantenham dossiês técnicos de seus produtos e embalagens para facilitar a identificação de imitações e subsidiar medidas administrativas e judiciais perante o INPI, Polícia Federal e autoridades fiscais. Além disso, o monitoramento de mercado, cláusulas contratuais de auditoria, confidencialidade e controle de qualidade são instrumentos eficazes para preservar o trade dress e os segredos industriais.
Além da robustez contratual e da proteção marcária contínua, outros métodos fortalecem a proteção da identidade da marca, como certificações tecnológicas e mecanismos de rastreabilidade e logística reversa. Combinadas, essas estratégias deixam de ser um diferencial e se tornam uma necessidade vital.
A crise do metanol revela uma realidade frequentemente negligenciada: proteger a marca é proteger a credibilidade do produto, a confiança do consumidor e, em muitos casos, a própria saúde pública. Em um mercado em que a autenticidade, a segurança e a reputação caminham juntas, a proteção e o monitoramento das marcas deixam de ser apenas uma obrigação legal e se consolidam como ferramentas estratégicas de defesa empresarial.